…enquanto isso, três cupins operários, membros do filo Arthropoda, da Classe Insecta e da Ordem Isoptera, sob o tampo da mesa, de ponta cabeça , disputam qual leva o fiapão de cortiça de volta ao cupinzeiro que fica além da janela do auditório do instituto, sob o sol dos trópicos.
Sem questionar se o ganho eletromagnético dos pontos quânticos das camadas moleculares das cabeças de fibras de miosina dos feixes musculares de seus aparelhos roedores, nem se a solução da aplicação da teoria quântica de perturbação de segunda ordem à equação de Schrödinger dependente do tempo gera uma matriz de transição do bulk quântico em movimento browniano do grupo carboxila das proteínas do ritidoma lenhoso das dicotiledôneas, os insetos disputam quem receberá as cobiçadas congratulações da rainha cupim.
Disputam a consagração de seu heroísmo.
Heróis sim. Não ousem pensar que é fácil esquadrinhar todas as encadeadas janelas do auditório em busca de uma estreita passagem para os tesouros dos tecos de cortiça da madeira de lei do tampo da mesa, nem combinar os movimentos das patas articuladas por um caminho esconderijo, cruzando cabos de microfones, Internet, fios de eletricidade, sem provocar ruídos acima de 20dB, nem provocar impressões de movimento nas retinas humanas.
Sem tomar conta da pressão exercida pelo orientador sobre o mestrando para que acelere, sendo exímio explanador, sua apresentação do exame de qualificação sobre seu trabalho realizado a respeito dos ganhos em laser de diodos semicondutores em função da injeção de portadores, um grupo de protozoários tripanossoma, membros do Reino Protista, do filo Euglenozoa, da classe Zooflagelatea e, com orgulho, da espécie Trypanossoma cruzi, investigam os tecidos das entranhas de um dos cupins para descobrir se de fato atingiram o hospedeiro intermediário adequado.
Nem cogitem pensar que é tranqüilo confinar os movimentos vibratórios do ar do exoesqueleto de queratina do inseto (barbeiro, supostamente) de modo a amplificar os efeitos Doppler em três dimensões a fim de localizar se hospedeiro favorito, nem investigar camadas e camadas celulares através do acoplamento do flagelo ao retículo endoplasmático das células hospedeiras e descobrir, para surpresa frustrante, que não se trata de um ambiente favorável ao acasalamento e proliferação e que também não conseguirão atingir o paraíso dos macrófagos e miócitos de humanos, seu hospedeiro definitivo...
São também, sim, senhores, heróis. Frustrados, mas heróis.
Afinal, quem é mais frustrado: o orientador da tese, o aluno de mestrado, os dois cupins perdedores, ou a família dos Cruzi? Ou ainda o cágado, membro da Ordem Testunidata e família Chelidae, que anda vagarosamente pela sala fechada roçando seu casco duro nas paredes brancas duras?
Teoriza-se que os protozoários são menos frustrados. Seus questionamentos, retirado todo o peso emocional da descrição toda, são de ordem existencial mais prática. Têm menos interrogações na mente. E as presentes, são mais objetivas. De modo que são menos, probabilisticamente, passíveis de passarem por frustrações irreparáveis e crises existenciais. Assim, mais dificilmente entristecidos, mais felizes, aptos a sobreviver e deixar descendentes do que os cupins, o cágado, o aluno, e lógico, o orientador. Perdendo evolutivamente apenas para as gramíneas de fora, supondo-se haver, pois o filme preto sobre os vidros dificulta a averiguação.
Traça-se aqui um exemplo da Teoria Evolutiva da Aceitação, em que seres são mais evoluídos quanto menos são os questionamentos contra os quais se debatem, desfrutando de uma existência mais serena, numa esfera mais pacífica.
De onde se conclui que somos da espécie mais primitiva, sendo o orientador, sem dúvidas (e com todas as dúvidas, suas) um dos mais primitivos de nossa era...
BIU05-01-2006
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