“... O silêncio total me deixou ainda mais apreensivo. Salas de espera nos obrigam a pensar que vamos morrer, e por mais edições antigas da revista Caras que tu folheie, não conseguirá abafar a consciência de que há uma parte do seu organismo se deteriorando, de que teu corpo é temperamental e pode simplesmente se rebelar contra ti, e de que agulhas e químicos e instrumentos de metal serão enfiados em locais desagradáveis causando dores e muito dinheiro será gasto pra que as coisas voltem temporariamente ao normal , pra tentar resgatar aquela ilusão de que o corpo é um veículo sob o nosso controle..."
(pág. 49)
“... No entanto ela me encarava sorrindo, com os mesmos olhos que eu encontrava antes nas manhãs, um olhar que nos conectava e expressava que éramos parte um do outro. É difícil imaginar sensação de maior conforto e serenidade do que esta, que surge da ilusão elaborada de que fazemos parte da vida de uma pessoa a ponto de estarmos verdadeiramente unidos, de tudo estar bem se o outro estiver por perto, se apenas nos for dada a chance de saciar os desejos e interesses um do outro, de tolerar um ao outro quando sacrifícios forem necessários e deixar que todo o resto se foda, se destrua e morra, porque não haverá problema. Aquele olhar dela era uma manifestação perfeita dessa ilusão confortadora. Durava pouco, apenas instantes, como qualquer êxtase, mas era eficaz....”
(pág. 81)
excertos de "Até o dia em que o cão morreu" (adaptado para o cinema em "Cão sem dono")
Daniel Galera
(pág. 49)
“... No entanto ela me encarava sorrindo, com os mesmos olhos que eu encontrava antes nas manhãs, um olhar que nos conectava e expressava que éramos parte um do outro. É difícil imaginar sensação de maior conforto e serenidade do que esta, que surge da ilusão elaborada de que fazemos parte da vida de uma pessoa a ponto de estarmos verdadeiramente unidos, de tudo estar bem se o outro estiver por perto, se apenas nos for dada a chance de saciar os desejos e interesses um do outro, de tolerar um ao outro quando sacrifícios forem necessários e deixar que todo o resto se foda, se destrua e morra, porque não haverá problema. Aquele olhar dela era uma manifestação perfeita dessa ilusão confortadora. Durava pouco, apenas instantes, como qualquer êxtase, mas era eficaz....”
(pág. 81)
excertos de "Até o dia em que o cão morreu" (adaptado para o cinema em "Cão sem dono")
Daniel Galera